sexta-feira, 8 de novembro de 2013

[Coluna] Não somos nada especiais

Foto: Futura Press
Palmeiras subverteu até a religião pra criar seu Santo
por Dimitrius Pulvirenti


O Lance! noticiou hoje a proximidade do acerto entre Caixa Econômica Federal e Palmeiras para o patrocínio principal da camisa. O acerto é polêmico, uma vez que a Caixa é uma empresa ligada ao governo e o acerto, de acordo com a reportagem, foi intermediado por Gilberto Carvalho, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República. O valor do patrocínio é bastante interessante, mas a que preço ao Palmeiras?

Antes, um aviso: posso ser bastante idealista nesse texto. Mas esse aspecto em particular do Palmeiras é importantíssimo pra mim.

Torcer por um time não é sempre como caminhar por um campo de lírios. É impossível o time ganhar sempre. Invariavelmente, ele será derrotado, eliminado ou humilhado. Torcer pelo Palmeiras é pior ainda, visto que tem se resumido apenas às derrotas, eliminações e humilhações. Esse perene calvário e uma inclinação à auto-reflexão me levaram a questionar por que torço pelo Palmeiras. O que o Palmeiras tem de diferente de outros times? O que faz ele ser único?

Em se tratando de Palmeiras, sou muito mais José de Alencar que Machado de Assis. Sou o romântico idealista que parte em busca da descoberta do arquétipo de Palmeiras, do mito fundador desse povo. Não seria possível tomar tal caminho sem retornar para as origens do clube. Li um monte de coisa sobre a fundação do clube, os primeiros anos e etc. Adoro a história do clube, amo os momentos épicos pelos quais passamos. Situações delicadas que mostraram o núcleo da identidade do Palmeiras.

Entre outras coisas que acho que identificam o clube - não vou me alongar escrevendo tudo que acho sobre o tema -, está o separatismo. Não me entenda mal: o Palmeiras nunca quis criar outro país e isso não tem nada a ver com a Itália. Mas é recorrente na história do Palmeiras um constante atrito com o poder e as ideias estabelecidas, criando uma quase-cultura.

Não dá pra entender isso sendo anacrônico. É necessário transportar-se para uma época em que 1/3 da sociedade paulistana era italiana e se fazia premente a criação de organizações capazes de manter a cultura italiana. O Palmeiras nasceu com o propósito de manter uma cultura diferente daquela que estava ao redor por meio da prática do futebol.

Preste atenção: o Palmeiras não permaneceu um núcleo da colônia por muito tempo e hoje é popular e brasileiro. Mas foi assim que nasceu e cresceu com um contexto no qual isso fazia todo o sentido.

Há várias passagens em que isso se expressa: em 1942, talvez o auge dessa atitude, quando se ensimesmou para combater os interesses no seu patrimônio, defendendo do remate sua sede. Ou posteriormente, quando assumiu o porco, antes xingamento, como seu mascote. A facilidade que temos para gostar de jogadores que fogem do comum: o "lento" Ademir da Guia, o intenso e sincero Marcos durante a época do politicamente correto no futebol.

Acreditar que o patrocínio da Caixa resume-se apenas ao dinheiro é ignorar tudo o que faz o Palmeiras ser o que é hoje, isto é, do time que se recusou a fazer como os outros fazem, que nasceu já com a proposta de ser único, diferente, que jamais se importou em ser a ovelha verde. É muito superficial acreditar que a discussão seja se a Caixa é estatal ou mista.

Isso é relevante: a Caixa é do governo, é a que patrocina todo mundo que, por algum motivo, tem certo poder de bastidor no Planalto. É a empresa que patrocina o ASA porque o Collor pediu. É a empresa que pode patrocinar o Palmeiras porque o Gilberto Carvalho pediu. É o patrocínio-símbolo da adesão do Palmeiras ao clientelismo. Porque me custa a acreditar que o que motiva a Caixa a patrocinar Palmeiras e ASA seja marketing. Porque me dói ver o Palmeiras entrando nesse jogo político que não lhe interessa em nenhum aspecto.

Talvez seja exagero meu, eu sei. Talvez o Palmeiras não seja nada demais, apenas mais um time como os outros e que a diferença tenha sido o fato de eu nascer em uma família que torcia pelo Palmeiras e não pelo Corinthians ou pelo São Paulo. Já estou ficando velho e talvez seja a hora de perceber que não sejamos tão especiais.

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